obs:

O título desse blog é infeliz, mas só reparei depois. "Anti-país dos petralhas" dá impressão que sou contra os "petralhas" (como Reinaldo Azevedo se refere ao PT). Não, eu quis dizer que sou contra o Reinaldo e seu livro "O país dos petralhas".
É tão infeliz quanto uma pessoa de direita ser contra Marx e botar "Anti-O capital" e as pessoas acharem que a pessoa é anti-capitalista...
Bem, temos de conviver com os nossos erros né?

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

A esquerda é melhor que o Fora do Eixo?

(série sobre Fora do Eixo, a partir das repercussões do caso Beatriz Seigner - resumo aqui)
(originalmente escrito e divulgado -emails, facebook - no dia 9/8/13)

 A intenção é fazer uma crítica construtiva mostrando as contradições. E também humanizar a visão sobre como os artistas vivem.

Fiz e refiz o título do artigo, mas acho que não tá bom... a minha intenção é de pontuar críticas construtivas.... mas receio que para alguns soem mais críticas que construtivas e se afastem de mim. Pensei várias vezes em me abster da discussão, o que não queria é que os meus amigos de esquerda se afastassem de mim (são de várias organizações, até conflitantes entre si, mas os admiro), mas por hoje, vou escrever como um artista que vê a esquerda discutir o FdE e chamarei a atenção para algumas contradições.

Por coincidência o relato da Beatriz vem ao mesmo tempo que a UNE volta a ter monopólio sobre as carteirinhas que servirão para serem utilizadas sobre 40% dos ingressos. Vi que a oposição da UNE está dizendo que é um retrocesso no acesso à cultura como direito, etc. Mas eu comentei que por outro lado, a carteirinha estudantil estava servindo majoritariamente para acesso à cultura alienante e até elitizada (ingressos a shows que custam mais de R$ 300) e que desse ponto de vista, não se perdeu muito. Não estava cara a cara com ela, foram comentários no facebook, mas senti que ela não gostou muito do meu ponto de vista.

O que a cineasta Beatriz criticando o FdE e a carterinha da UNE têm a ver? Ora, simples, o cinema! O que quero dizer é que não adianta por um lado aplaudir artistas sendo reprimidos e do outro defender uma carteirinha para a juventude ver um cinema hollywoodiano. Se for assim, é o mesmo que pegar a crítica da cineasta para atacar um concorrente e a cineasta que se dane. Essa é a postura de Reinaldo Azevedo e seus seguidores (o relato dela foi parar no site da Veja) que pelos comentários é possível ver que por eles, a crítica serviu para desmascarar a Mídia Ninja e por eles não existiria financiamento à arte, nem à mídia (contraditório, pois a própria Veja recebe verbas de publicidade estatal) e não defenderiam sequer o cinema nacional.

"Ah, mas a UNE promove o Bienal da Cultura!". Sim, mas em dose homeopática em comparação ao montão de gente que vai ver cultura alienada com a carteirinha. Mas bem lembrado, isso me lembra que anos atrás, uma artista reclamava que não foi paga pela participação na Bienal da Cultura da UNE. Talvez a oposição da UNE esteja sorrindo "ah, uma coisa em comum entre a majoritária da UNE e a FdE: não pagam os artistas!...." Bem, vou ter de pedir para tirar o sorriso, pois eu tava repassando a denúncia para ver se o caso ganhava alguma solução por via da publicização. Mandei para uma lista onde tinha um diretor da UNE. Eu questionei: "fulano, se você é direitor da UNE não pode fazer algo?" Ele respondeu que não faz parte da majoritária, e sim da oposição da UNE, que cultura não é com ele e que assim não faria nada! Foi até seco e sequer repassou a denúncia... sei lá, ele poderia ter repassado para os companheiros também de oposição para denunciar como tática da majoritária... mas não, simplesmente o assunto morreu na caixa de mensagens dele. Isso até me faz pensar se na verdade o relato da Beatriz não teria sido espalhada mais por ser um caso notório (e político) do que por um caso de injustiça. A injustiça que a diretora de cinema viu foi publicizada, e a injustiça de uma encarregada de organizar o Bienal morreu o assunto na caixa de mensagens do diretor da minoritária da UNE... (essa é uma parte que quero que me entendam como crítica construtiva! O que quero dizer é: publicizem a injustiça e se possível tentem resolver os casos. Nem estou dizendo que foi má-vontade pois não conheço o funcionamento das diretoras da UNE. Vou explicitar isso para não antipatizarem comigo à toa pois tem mais coisa à frente!)

O artigo "Lulismo fora do eixo" de José Arbex Jr. só consegue mostrar conexão temporal entre lulismo e FdE: Lula se tornou presidente, dali a pouco FdE apareceu... que conexão fraca! (isso até me lembra de um quadrinho que fiz: "você nasceu no mesmo país de Lula e mesmo assim nega ter jantado com ele?"). Estão achando mais conexões entre FdE e PT? Mas também entre FdE e Marina e até FdE e PSDB? Ótimo, ótimo, são dados recentes e de qualquer forma vocês estão melhores que o Arbex. Mas o artigo dele não é só sobre isso, ele diz haver conexão também entre "Lulinha paz e amor" e a mensagem pacifista das marchas atuais. Se bem que ele se refere à Marcha da Liberdade que aconteceu há uns anos, mas de qualquer forma, Arbex e outros ficam achando que as marchas atuais chamadas com internet e redes sociais atrapalham o ressurjimento de marchas parecendo aquelas de pinturas da revolução francesa. Sinto muito, mas nesse ponto tenho de concordar com outros autores que dizem que a esquerda tradicional está com dificuldade de lidar com as novas tecnologias, decepção com partidos políticos, etc. Até porque as marchas atuais não são apenas de face pacífica, a outra face, violenta - a do Black Block - também está sendo criticada (tem críticas do PSTU e da LER-QI criticando o PSTU. Imagino que LER-QI não se junta à violência do Black Bloc mas diz ser uma expressão popular a ser compreendida, e ao mesmo tempo denuncia o pacifismo à qual se juntou o PSTU; e o PSTU deve estar fazendo o inverso, dizendo que não se junta aos pacifistas mas o pacifismo é expressão popular e como LER-QI se junta ao Black Bloc).

Tá, talvez tenha pegado um pouco pesado no parágrafo anterior, eu por mim diria que no fundo não adianta tentarmos adivinhar os caminhos do povo, e que é válido tentar guiá-los para algum caminho desde que essa guia não sirva para improdutivamente um grupo ficar alimentando rivalidade desmobilizadora em relação ao outro.

Mas voltando ao Arbex, o artigo dele saiu na Caros Amigos! Daí entra outra contradição pois a Caros Amigos esse ano que tem gente saindo de dentro, reclamando de trabalho escravo, etc. Enfim, dizem que há trabalho voluntário/escravo no Mídia Ninja/FdE, mas Caros Amigos foi um projeto que por anos e anos a esquerda dizia para os trabalhadores lá dentro que era melhor eles aguentarem, é por um bem maior, etc. Inclusive, os relatos tristes da ex-FdE Laís Bellini ( https://www.facebook.com/lcbellini/posts/702021409824865) me fizeram pensar que o que se falava dentro da Caros não devia ser diferente. Aliás, um dos espaços usados para escrever sobre o FdE é o site PassaPalavra, e provavelmente os autores estão postando lá sem pensar em como os funcionários do site se viram, etc. Eu não conheço como funciona esse site, se quem trabalha está feliz, muito bem, mas quero dizer que tem muitos projetos por aí com trabalho mal-remunerado ou voluntariado, então não deviam encarar o caso do FdE como um alienígena.

Também sei de pessoas que saíram de partidos, na saída estavam muito decepcionados e tristes, e nisso também vejo semelhança com os relatos de quem saiu do FdE. "Ah, mas FdE não é partido", pois é, seria aceitável o trabalho pouco remunerado/voluntário/escravo se fosse de um partido, ou movimento social, ou de um jornal de esquerda? (um importante adendo: esses defeitos tolerados são vistos não só na esquerda. Acontece cosia semelhante em grupos de direita, em ONGs, entidades religiosas, etc. Cada um doa sua dedicação para o que achar melhor.) Afinal o que é o FdE?

Dizem que o FdE é uma mistura de partido, agência publicitária, seita, coletivo de artistas, etc, etc. Sendo que partiram da área cultural/artísitca, a pergunta a seguir é: a esquerda está mesmo enxergando os artistas?

Encaro que denunciar o FdE como receptor de patrocínios de entidade privadas e de verbas públicas, não sei se a esquerda percebe, mas o fato em si não quer dizer muita coisa. Além de ser algo comum, há contradição em exigir que o governo financie a cultura mas reclamar que tem mais artistas recebendo verbas. "Ah, mas porque tantos artistas que aparecem em locais públicos?", bom, então você entra em outra contradição que é reclamar que tem artistas que ficam em seus ateliês, e não gostar dos artistas que fazem da rua seu suporte artístico."Ah, mas uma coisa é intervenção artística urbana, outra é artista com posição política", bom, contradição de reclamar que artista não se politiza... "Ah, mas Frida Kahlo era politizada mas separava...", bom, aí que entra a coisa moderna de arte sem suporte, performances, e outras discussões que SÃO VÁLIDAS ARTISTICAMENTE.

Vocês podem não concordar com eles, mas os que acham que FdE estão se inserindo onde não deviam estão errados, FdE pode fazer o que quiser, a questão é se isso é bem recebido ou não. Tem artista que diz que quer mostrar a podridão do mundo e o fim da arte, aí vende aos milionários animais apodrecendo. Eu por mim diria que o artista foi irônico e aparentemente os milionários não entenderam e foram enganados, mas tudo bem, isso é permitido e é arte. Um coletivo de artistas colocou pães nas árvores na praça e uns mendigos perguntaram se podiam pegar para comer e um deles disse que ia pegar, mas que se sentia humilhado, mesmo que a artista explicasse que não é para humilhar que deixou os pães nas árvores para serem pegos, isso também é permitido. Merchands financiam pixadores que enfeiam muros alheios, e não que o merchand tivesse quererndo destruir a propriedade privada de concorrentes, é uma reflexão, uma atitude, é arte!

Já houve intervenções artíticas que mudou a realidade? Bem, eu diria que sim, como no caso dos artistas terem ido à ocupação Prestes Maia (tem imagens e relatos na internet, eu também participei por um período). "Ah, mas isso só gera registros e discussões entre artistas e estudiosos da arte, do que isso adianta?" Bem, sinto informar que muitos dos debates que a esquerda faz também só gera papo entre os entendidos e acadêmicos, os intelectuais de esquerda quando criticam, se sentem os tais, mas no final seus escritos vão ficar guardados pela academia, e eu poderia perguntar do que isso adianta.

"Mas o ponto é: vai haver revolução com a arte?" Bem, talvez... não sei se é, mas talvez a revolução seja a grande obra artística que o FdE almeje, não sei, tem de perguntar a eles. Se querem fazer parte da história, se querem ser a história. "Revolução é o objetivo dos movimentos e partidos, essa é a diferença com FdE", infelizmente nesses tempos, não é possível dizer dessa forma. "Ah, mas FdE cria entraves!", bem os movimentos e partidos estão toda hora acusando uns aos outros de serem entraves!

Opa, vai parecer que estou defendendo o FdE, não é isso. Essa coisa grande que se tornou FdE, mistura disso e aquilo... numa palavra eu diria que é medonho! Sei que medonho é um adjetivo vago, mas essa é a palavra que me ocorre, principalmente lendo os relatos de ex-FdEs. A questão central é: podemos criticar o FdE, mas eu digo que eles têm de ser entendidos no contexto da arte, e os que saíram também têm de ser entendidos enquanto artistas! Quero chamar a atenção para as especificidades da vida deles, para que a compreensão fique mais próxima, mais humana! Não é por serem uma seita que seus membros se submeteream àquelas condições de trabalho, isso se vê em muitas organizações (partidos, ONGs, Igrejas...). O problema não é o fato de receberem patrocínios e verbas (jornais da Veja à Caros Amigos também recebem), nem de ganharem bolsas para estudar e ajuda para palestrarem (como os intelectuais/pensadores de qualquer ideologia). Onde está o problema então?

Pois é, aí olho novamente para a esquerda e pergunto: será que o problema simplesmente não estava na disputa de espaços, coisa que a esquerda faz entre si há tempos? Coisa pela qual, inclusive os inescrupulosos dizem: "opa, publiciza o que a cineasta e os artistas estão dizendo, mas depois o cinema e a arte que se danem!".

Pode ser que que seja apenas disputa de espaço? Eu vejo muitos sinais, e inclusive não acho que isso seja muito saudável de se fazer em pleno período de mobilizações populares. Mas a verdade é que vi pessoas divulgando a Midia Ninja após os compartilhamentos de materiais contra os Anonymous! Quer dizer: a Midia Ninja ganhou espaço justamente porque tava rolando uma picuinha, acho isso muito irônico! (Apesar de parte da crítica contra Anonymous ser válida, a meu ver foi picuinha a discussão sobre usar ou não máscara, ou o significado da máscara de Guy Fawkes. Quanto à "mascarados não me representam", é engraçado que um amigo que postou a frase agora adota como avatar a figura de um mascarado do ELZN! E quanto à Guy Fawkes, acho improdutivo ficar vasculhando a origem. É como ficar vasculhando o significado da figura do palhaço - vocês sabiam que as roupas largas, bochechas e nariz vermelhos, na sua origem era para rir dos pobres? -, ou ainda, da origem da tão cultuada Mafalda de Quino. Enfim, para mim o uso da máscara é apenas expressão, assim como na Revolução do Chá nos EUA os manifestantes se vestiram de índios para atacar os navios ingleses e provavelmente não pensaram a fundo no significado da figura do índio - talvez o racismo americano fosse menos forte se tivessem pensado a fundo, e não apenas encarado apenas como símbolo contra o poderio britânico - que o monarquista Guy Fawkes também combateu).

Reforçando para finalizar: reflitam se a crítica ao FdE não é picuinha (sendo que a Midia Ninja ascendeu a partir da picuinha contra Anonymous), entendam o contexto da arte, o modo de vida (e motivações) dos artistas, e façam coisas úteis no contexto atual de mobilizações (Se a Caros Amigos e Midia Ninja são escravistas, que mídia é boa?)

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